A MORTE ANUNCIADA - LUIZ CARLOS MORENO



A MORTE ANUNCIADA

Pensar não importa mais. Estamos matando os pensadores, se atenuar um pouco, tornando-os desnecessários; nada de novo, porque sempre foram desprezados e a humanidade seguiu por seus descaminhos; as universidades os acolheram e eles subiram no pedestal. Agora, serão derrubados porque o próximo passo é a destruição das universidades.
E junto com os pensadores estamos matando os seus irmãos PROFESSORES. Aqui não há eufemismo. Substituídos sistematicamente por apresentações espetaculosas e palestras gravadas sem o menor interesse ou possibilidade de interação, de troca de ideias, de exemplos ampliados, exercícios aplicados e contextualizados. Temos em alguns casos, PROFESSORES substituídos por monitores. A geração de PROFESSORES (aqueles que professam a fé naquilo que fazem) será morta pelo COVID 19, afinal somos grupo de risco, ou pelo TEMPO (este é implacável e cruel). Cumpre registar que Hector Berlioz (1803-1869) escreveu: “O tempo é um ótimo professor. Pena que mata seus alunos”. Cumprimos a nossa missão... continuaremos lutando pela sobrevivência, ainda que seja certo que a adaptação para a involução é mais dolorosa do que para a evolução. Vem aí uma geração de analfabetos disfuncionais e estúpidos, operadores de tecnologias cada vez mais embrutecidas. Alguns já estão até nos governando.

“Pensamento crítico consiste em tratar de assuntos imperiosos examinando com um tanto de ceticismo as questões relacionadas a eles, geralmente olhando-as, e a tudo, mais atentamente”. Escreveu Martin Cohen.

Estamos perdendo o senso de equilíbrio, de profundidade de compreensão e de precisão – porque estamos imbuídos de superficialidade e de velocidade.  
Muitos seres humanos estão abdicando da capacidade pensar, de criar. Não importa mais a confiança, a curiosidade, as habilidades críticas, a procura pela verdade e a tolerância.
O título deste artigo nasce da leitura crítica de uma passagem:
“A causa fundamental do problema é que no mundo moderno os estúpidos estão cheios de certeza, enquanto os inteligentes estão cheios de dúvidas”. Bertrand Russel (1872 – 1970).
Seres inescrupulosos em postos de comando ou de poder -  observem que estamos revivendo com muita intensidade o retorno dos extremistas - são muito hábeis em utilizar anúncios e plantar notícias falsas para confundir os leitores e pensadores acríticos que ansiosa e irrefletidamente já ampliam a propagação nas redes.
Temos uma nova categoria atuante: ‘influenciador digital’ que alimentam o populacho com banalidades e futilidades, criticamente são meros veículos de fofocas. Uma busca no universo da música nos evidenciará pessoas do sexo feminino com corpos modelados em academias e por treinadores pessoais que vivem muito mais de exibir seus corpos padronizados (alguns até com um exagero artificial e desproporcional) em veículos onde os anunciantes pagam por visitas ou cliques. Voz, letra, conteúdo, música mesmo, qual?
Alienados, embora insistam em se dizer participativos, não leem, não escrevem, não fazem cálculos, não se informam adequadamente, ficam navegando na superfície das ondas das redes sociais.
Fala-se muito em reinventar o mundo, a vida com os produtos digitais que nos são empurrados neuro tecnologicamente pelo neuro marketing. Em breve, chips implantados diretamente nos nossos cérebros tomarão decisões mais acertadas por nós. Fim da capacidade humana de escolha. A ciência e a religião, em confronto, sempre discutiram o ‘livre-arbítrio’. Encerrada a discussão. A tecnologia detecta e potencializa nossas preferências por hábitos de consumo. Editoras estão falindo e livrarias fechando. Uma boa parte da história da humanidade se deve aos livros e sua influência civilizatória. Para as atividades de ensino e aprendizagem, como estão matando os PROFESSORES, não existem mais escritores, foi criada a categoria de ‘conteudista’. Pode-se adjetivar: muito restrito, muito sintético, objetivo, uma única ideia direcionada.
A tecnologia isolou as pessoas nos seus mundos restritos, proporcionando-lhes a ilusão de que estão ‘conectados’ com o mundo em tempo real. Os relacionamentos virtuais substituíram os relacionamentos reais e simultaneamente a estupidez humana substituiu o respeito e a sensibilidade. A confirmação dessa tese pode ser obtida fazendo-se uma verificação da grosseria, pobreza e incorreção do vocabulário, da banalidade das expressões. O assassinato da língua vem de arrasto.
Escrever demanda alguns fatores essenciais, que nesta geração escapa ao domínio por preguiça e conveniência: conhecimento da língua; organização, habilidades de comunicação e prática, muita prática. Retornamos aos hieróglifos, agora denominados emojis.
As redes, em grande parte, servem muito bem às banalidades.
Evidentemente, essa característica desta geração também contamina as atividades profissionais, quando as pessoas portadoras de diplomas e de vários cursos, portanto aparentemente bem qualificadas, não demonstram nenhum conhecimento e muito menos interesse em se desenvolver naquilo que estão fazendo ou escrevendo. Aparentemente são incapazes de conceber, projetar e desenvolver um modelo de formulário aplicável à realidade do seu ambiente de trabalho para sua necessidade especifica. Nas redes os pares se socorrem. Assim, por exemplo, um documento que foi utilizado numa atividade de supermercado, é enviado para um colega pedinte (porque miserável, intelectualmente) para utilizar numa indústria sucro-alcooleira. Ajudar outros seres humanos é nobre. Mas quando substituímos a pesquisa, a criatividade e o fazer pela comodidade do pedir, pela incompetência em produzir, estamos perdendo o profissionalismo ou a dignidade.
Para encerrar, retorno ao raciocínio exposto no início deste texto, registrando que um autor não citado, mas certamente um pensador iluminado, escreveu: “Mais vale um asno vivo do que um filósofo morto, mas é melhor morrer como filósofo do que viver como um asno”.
LUIZ CARLOS MORENO
Cogitações Impertinentes

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