FELICIDADE É INÚTIL - CLÓVIS DE BARROS FILHO

 BARROS FILHO, Clóvis de. A felicidade é inútil. - Porto Alegre, CDG, 2019.


Toda reclamação advém em desalinhamento entre um flagrante de ocorrência de um mundo fora de nós e alguma expectativa a respeito desse mesmo mundo em nós. p. 70 - 71


Quanto mais tivermos expectativas sobre as coisas e quanto mais observarmos o mundo a nossa volta, mais encontraremos desencaixes. p.71


O objeto mais recorrente de nossas lamúrias são pessoas como nós. Seus interesses, gostos, escolhas, decisões, ações, estratégias, etc. p.72


A energia que nos anima, a potência que nos movimenta, essa sobe e desce. Se agiganta e se acanha. Indicando mais ou menos vida. Nossos afetos são interpretações dadas pelo nosso corpo e nossa alma a respeito do que vai acontecendo com eles. p.81


Se a tal felicidade estiver vinculada à satisfação simultânea de tudo que desejamos, estaremos irremediavelmente condenados a uma vida infeliz. p.93


Já vivi o suficiente para ter a singular certeza de não conhecer bem coisa alguma. De não saber quase nada sobre quase tudo. p. 96


Qualidade de vida é padrão genérico de existência. Reunião de critérios ditos objetivos e inventados pelo homem. Ninguém vive essa tal qualidade de vida. Não existe no mundo enquanto tal. É só uma referência. O que há é vida. E o que poderia haver na carne, osso e alma de cada um de nós é vida de qualidade. Coisa bem diferente. p. 103


Ainda sou daqueles que amam escola. Se houve alguma felicidade na vida, foi aprendendo e ensinando. Sinto-me particularmente excluído por não flagrar o mesmo sentimento nos outros. p.134


O mundo já estava no lugar. Tem direitos adquiridos. Chegou primeiro. Você aparece de paraquedas. E já quer sentar na janelinha. Mudar tudo do seu jeito. Não é bem assim que a banda toca. p. 167 - 168


O talento vem sempre acompanhado da inveja do desprovido. p.170


Nenhum instante da existência, nenhum fragmento de vida tem a menor razão de ser senão estiver devidamente ajustado a todo o resto, que dele depende. p.182


Por que homens e mulheres, podendo viver em harmonia, felizes, explorando seus recursos e integrando harmonicamente o todo, por que optariam por uma vida em desmesura, em desencaixe, e desarmonia? Por ignorância, com certeza. É a tese de Sócrates. 

Afinal de contas, encaixar-se por escolha ao todo implica ter grande conhecimento de si mesmo. E algum conhecimento do resto, do todo, do universo. Conhecer-se a si mesmo tornou-se a dica primária e fundamental. Condição primeira de uma vida feliz. p.184 - 185


Ignorância de si mesmo

A filosofia ocidental começou com uma recomendação. A do autoconhecimento. Conhece-te a ti mesmo. Assim, o mais intolerável é essa particular ignorância. Que tem a si próprio como objeto.

Com efeito. Não parecia aceitável. O desconhecimento de si mesmo. De seus próprios atributos. Da própria natureza. Esse particular ignorante se encontra privado, em definitivo, de qualquer excelência. Viverá à deriva, a esmo. Perdido numa trajetória sem sentido e sem direção.

Assim, aquele que ignora a sua praia, isto é, as fronteiras de mundo nas quais sua essência é mais efetiva e eficaz, está impossibilitado de distinguir as condições de vida que lhe são mais adequadas.

O ignorante de si mesmo é candidato forte a uma vida fracassada por ignorar onde está, de que meios dispõe e aonde precisa chegar. p. 226 - 227


Nem o rio esperou pelo segundo banho. Nem o banhista esperou pelo segundo rio. p.279 (Heráclito na leitura de Clóvis)


Projeto de estar junto

O lamento pela ausência do ser amado. O desejo da sua presença. Do compartilhamento. Por isso, além de viver desejando que não acabe, ou repetir o vivido, nada impede que vivamos desejando a presença daqueles que mais amamos. Não iríamos querer proporcionar-lhes uma vida fracassada, frustrada, entediada, angustiada, sem graça. De jeito nenhum. p.283 




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