BUDISMO PARA LEIGOS - JONATHAN LANDAW - anotações de leitura

 LANDAW, Jonathan. Budismo para leigos. – Rio de Janeiro: Alta Books, 2011


Cultivando a sabedoria ao refletir sobre o que ouviu ou leu

 

Os mestres budistas lhe aconselham a ser cético em relação aos ensinamentos que recebe, mesmo se eles vierem diretamente do próprio Buda.

Não aceite passivamente o que você ouve ou lê, também não rejeite automaticamente. Em vez disso, use sua inteligência. Decida por si próprio se os ensinamentos fazem sentido em termos da sua própria experiência e da experiência dos outros. Então, como o Dalai Lama do Tibete  geralmente aconselha: “Se você achar que os ensinamentos se aplicam a você, empregue-os à sua vida, o máximo que puder. Se não forem aplicáveis, deixe-os.”

Por si própria, a sabedoria adquirida ao ouvir não o levará muito longe. Se quiser progredir espiritualmente, você tem que entender o significado daquilo que ouviu – ou leu. Você chega a esse entendimento cultivando a segunda sabedoria: a sabedoria adquirida por meio da reflexão. Reflexão significa que você luta com os ensinamentos que ouviu (ou leu) até que extraia deles o significado pretendido. Você realiza esse feito empregando todas as suas faculdades mentais e uma análise mais detalhada e precisa possível. Essa ação relembra o conselho de Buda sobre não aceitar seus ensinamentos pelo valor que parecem ter, mas testá-los, para ter certeza se são verdadeiros – ou não.

Siga o ensinamento, não a pessoa. BUDDHA 

Fonte:

LANDAW, Jonathan. Budismo para leigos. – Rio de Janeiro: Alta Books, 2011


Mente, cabeça e coração

No Ocidente a tendência é pensar sobre os vários aspectos da consciência mental tendo como base um destes dois lugares: a cabeça ou o coração. Funções como saber, pensar, raciocinar, lembrar e analisar - em outras palavras, funções que a maioria das pessoas geralmente considera mentais, por natureza - são designadas à cabeça. Se alguém tem uma inteligência acadêmica afiada, por exemplo, podemos geralmente apelidar essa pessoa de "cérebro". Quando as pessoas tentam enten­der um problema difícil ou lembrar-se de algo que esqueceram, geralmente coçam a cabe­ça, como se essa atitude pudesse, de alguma ' forma, ajudá-las a impulsionar seus processos de pensamento.

0 centro emocional de seu ser, por outro lado, geralmente é designado ao coração. Quando envoltas por fortes emoções, mui­tas pessoas batem no peito. Geralmente se diz que o amor, a coragem e uma série de outros sentimentos se originam ali. Na verdade, o coração se tornou o símbolo de sentimentos românticos (pense em todos aqueles cartões do dia dos namorados), e a palavra em inglês courage (coragem)

uma atitude corajosa da mente - está relacionada ao termo francês coeur, que significa "coração".

É interessante observar que outros órgãos, além do coração, historicamente já foram considerados como locais de diferentes emo­ções. Na época de Shakespeare, por exemplo, as pessoas viam o fígado como o lugar de ori­gem da paixão. Esse uso sobrevive até hoje no insulto da língua inglesa lily-livered (fígado de covarde), que significa "covardemente" ou "timidamente". Outras expressões como "não ter estômago para tal coisa" ou "fazer das tripas coração" indicam que, em uma de­terminada época, emoções específicas eram associadas a outros órgãos internos.

Observe que essa distinção estrita entre a natureza emocional do coração e as qualida­des mais intelectuais associadas ao cérebro e à cabeça não existem no Budismo. A pala­vra sânscrita chitta é traduzida como "mente," "coração", "atitude" ou "consciência", de­pendendo de seu contexto. Da mesma forma, a palavra japonesa shin também pode ser traduzida como "mente" ou como "coração".

 

 

Quando os budistas falam de desenvolvimento mental, não estão falando sobre ficar mais esperto. O desenvolvimento mental envolve relaxar a pressão que os estados “negativos” têm sobre sua mente e aumentar a força das qualidades “positivas” dela. (Colocamos essas palavras entre aspas, pois “negativo” e “positivo” são apenas termos relativos; não pense que uma par­te da sua mente é inerentemente “boa” e outra parte inerentemente “má”).

 

Impulsionar sua inteligência emocional - para tomar emprestada uma frase que se tornou popular, recentemente - depende, em grande parte, de seu desenvolvimento mental e espiritual.

 

Fonte:

LANDAW, Jonatahn e BODIAN, Stephan. Budismo para leigos. Alta Books. – Rio de Janeiro, 2011. p.29

ARHAT (sânscrito) = ser de elevada estatura espiritual; "o digno, aquele que merece louvores divinos".

DUHKHA = sofrimento, quando se deseja algo e não se obtém.



Entendendo a história de Buda

Até mesmo nessa versão resumida da história do príncipe Sidarta, você talvez já tenha encontrado uma série de motivos para não entender o valor do que é apresentado aqui. Por exemplo: como poderia alguém tão inteligente como Sidarta chegar aos seus 29 anos sem conhecer nada sobre as doenças, a velhice e a morte? Como poderiam as precauções, até mesmo do pai mais super protetor, ter protegido Sidarta dessas realidades severas?

Ainda assim, apesar dessas objeções, a história é verdadeira, em um nível profundo. Até mesmo nesse mundo moderno da instantaneidade, da comunicação globalizada e das informações momentâneas, as pessoas conseguem não enxergar o que está bem diante de seus olhos. Os sem teto enchem as ruas, mas permanecem invisíveis à maioria das pessoas. Nos hospitais, onde a morte está por todos os lados, a verdadeira condição de um moribundo geralmente não é revelada para nós. E já ouvimos até mesmo de algumas comunidades que as procissões funerárias só podem ocorrer à noite, para não assustar os moradores e transeuntes.

Negação é o nome do jogo, e você pode assisti-lo bem próximo a você. Se a realidade das tristezas da vida conseguir quebrar esse véu de negação, a experiência pode ser devastadora, transformadora. Como Sidarta, muitas pessoas desviam sua atenção das realizações mundanas e se voltam ao caminho espiritual, como resultado de alguma experiência inesperada de sofrimento ou perda. É claro que são poucas as pessoas que abrem mão de tudo ao primeiro sinal de doença e morte e saem em busca da verdade, como Sidarta o fez.

 p.49


p.54 - “As pessoas que estão ao seu redor estão fundamentalmente interconectadas – inclusive, com você – e são interdependentes – que cada ser ou coisa aparentemente separada, você inclusive, é meramente uma expressão única de uma única realidade vasta e indivisível.

Com essa perspectiva em mente (e no coração), dedique seus esforços espirituais não apenas a si mesmo e aos seus entes queridos, mas também em benefício – e pela iluminação – de todos os seres (que, na verdade, não podem ser separados de você)”.

LANDAW, Jonathan. Budismo para leigos / Jonathan Landaw, Stephan Bodian. - Rio de Janeiro: Alta Books, 2011. p.54

Você descobre que a realidade (incluindo você) é marcada pela impermanência, pela insatisfação e pela ausência de um eu duradouro e substancial. p.155


Podemos alcançar a sabedoria por meio da ESCUTA; da REFLEXÃO; da MEDITAÇÃO. p.155

REFLEXÃO significa que você luta com os ensinamentos que ouviu (ou leu) até que extraia deles o significado pretendido. p.156



A iluminação supera até mesmo o entendimento intelectual mais refinado e simplesmente não pode ser expressa de acordo com nossos padrões conceituais comuns. p.195


"Não dualista", simplesmente significa que sujeito e objeto, matéria e espírito "não são dois" - ou seja, são diferentes em um nível cotidiano, mas são um - e inseparáveis - no nível de sua essência. p. 200



Conferindo os dez desenhos da manada de bois

Desde que os dez desenhos da manada de bois foram desenvolvidos, há mais de oito séculos, na China, os alunos Zen os consultam como um mapa confiável para os estágios da iluminação, e os mestres Zen utilizam estes desenhos para instruir e inspirar seus alunos.

As imagens mostram os estágios progressivos do caminho, começando pela busca pelo boi, culminando na completa libertação.

Procurando o boi: A figura caminha pela floresta, com uma corda na mão. Você busca a verdadeira satisfação na vida, mas não consegue encontrá-la nos lugares mundanos comuns – carreira, relacionamentos, família e objetos materiais. Devido ao fato de que você ainda não foi apresentado à possibilidade de despertar para sua natureza verdadeira, não sabe, de fato, onde procurar.

Encontrando as trilhas: A figura segue as pegadas do boi. Você foi apresentado aos ensinamentos da tradição Zen, e ao menos sabe onde procurar, para encontrar sua verdadeira natureza. Você está na trilha por meio da prática da meditação, mas não viu o boi com os próprios olhos.

Vendo o boi: A figura segue a parte traseira do boi. Você tem sua primeira compreensão direta, finalmente! Agora você está certo que o boi da natureza verdadeira está em todo lugar e se expressa como tudo. Mas essa percepção rapidamente vai para o plano de fundo, e você ainda está a um longo caminho de torná-lo seu companheiro constante.

Capturando o boi: A figura segura o boi resistente com uma corda. Você está ciente da sua natureza verdadeira em todos os momentos e situações; você nunca se separa dela – nem por um instante. Mas sua mente continua turbulenta e desgovernada, e você precisa se concentrar para não se distrair.

Domando o boi: A figura leva o boi dócil por uma corda. Por fim, a mente se acalma conforme todos os traços de dúvida desaparecem. Você está estabelecido tão firmemente em sua experiência da natureza verdadeira que nem mesmo os pensamentos o distraem, pois você percebe que, assim como todas as coisas no universo, eles são apenas uma expressão de quem você é, fundamentalmente.

Levando o boi para casa: A figura, tocando uma flauta, monta no boi. Agora você e sua natureza verdadeira estão em total harmonia, como um cavalo e cavaleiro. Você não tem mais que lutar para resistir à tentação nem à distração, pois está completamente em paz, totalmente conectado à sua fonte essencial.

Esquecendo o boi: A figura se senta em uma cabana de palha ao nascer do sol. Por fim, o boi da natureza verdadeira desapareceu, pois você o incorporou completamente, sem separação. O boi era uma metáfora conveniente para levá-lo até a sua casa. Primordialmente, no entanto, você e o boi são um só! Sem mais nada para buscar, você está completamente tranquilo, encarando a vida conforme ela se revela.

Esquecendo o eu e o boi: Um círculo vazio. Os últimos resquícios de um eu separado se esvaneceram e, com eles, os últimos vestígios da percepção desapareceram. Até mesmo os pensamentos “Eu sou iluminado” ou “Eu sou a incorporação da natureza de Buda” não mais podem ocorrer. Você é, ao mesmo tempo, completamente normal e completamente livre de qualquer apego ou identificação.

Voltando à fonte: A natureza em pleno florescer, sem um observador. Após se fundir à sua fonte, você vê todas as coisas em toda a sua diversidade (dolorosa e prazerosa, bela e feia) como a expressão perfeita dessa fonte. Você não precisa resistir nem mudar nada; você é completamente uno, com o todo da vida. Entrando no mundo com mãos que auxiliam: a pessoa destinada a iluminação, feliz e com o ventre grande carregando um saco sobre as costas. Sem nenhum traço de um eu separado para ser iluminado ou iludido, a distinção entre os dois se dissolve em atividade espontânea e compassiva. Agora, você se move livremente pelo mundo como a água se move pela água, sem a menor resistência, respondendo alegremente às situações conforme elas surgem, ajudando quando adequado e naturalmente incitando o despertar nos outros.

 

Fonte:

 

LANDAW, Jonathan. Budismo para leigos / Jonathan Landaw, Stephan Bodian. - Rio de Janeiro: Alta Books, 2011 p.205 - 206



INTERROMPENDO O SOFRIMENTO: Os Três Treinamentos

 

Algumas pessoas pensam que podem encontrar felicidade duradoura atacando o décimo segundo elo – da velhice e da morte. Essas pessoas evitam comidas gordurosas, exercitam-se regularmente, aplicam cremes especiais ao primeiro sinal de rugas, tomam vitaminas, fazem tratamento de recomposição capilar, e assim por diante – tudo com a esperança de que esse comportamento, de algum modo, impeça que elas envelheçam. (Algumas pessoas até mesmo planejam congelar seus corpos, na esperança de que os médicos, no futuro, serão capazes de curá-las das doenças causadoras de suas mortes.) Cuidar de sua saúde certamente vale a pena, mas não importa o que você faça pelo seu corpo, você não vai conseguir adiar a velhice e a morte para sempre.

Os mais fracos dos doze elos são aqueles que parecem ser os mais fortes, no começo. A ignorância, o desejo e o apego – o primeiro, o oitavo e o nono elos – são responsáveis, primeiramente, por criar e depois por perpetuar o ciclo de sofrimento e insatisfação recorrentes.

A ignorância motiva as ações kármicas que plantam as sementes do sofrimento em sua mente; o desejo e o apego fazem amadurecer essas sementes no momento da morte, mandando você a um renascimento em que mais sofrimento e insatisfação serão inevitáveis.

Esses três elos são poderosos, mas todos se baseiam em um conceito errôneo fundamental – uma visão distorcida, uma mentira. Todos eles se baseiam em uma ideia quanto à natureza do “self” ou do eu que entra em conflito com a realidade. Nesse aspecto, são fracos. Se você conseguir desenvolver a sabedoria, que vê as coisas da maneira como elas realmente existem, poderá romper esses elos e alcançar a completa liberdade da existência cíclica (samsara). Não estamos falando sobre um afastamento desinteressado e insensível da vida. Em vez disso, estamos nos referindo à liberdade do sofrimento, que ocorre quando você está preso à roda da vida.

Buda ensinou que a forma para alcançar essa liberdade é praticar aquilo que ele chamava de três treinamentos, que forma um tripé sobre o qual toda a estrutura da prática budista repousa. Esses três treinamentos são

Sabedoria: A ferramenta

Concentração: A mira certeira

Disciplina moral: A força

A seguir é apresentada uma analogia tradicional que explica esses três treinamentos. Imagine que você tem uma árvore em seu quintal produzindo frutas venenosas. É claro que você vai querer se proteger e aos outros dessa situação perigosa, por isso decide se livrar das frutas. Mas como fazer isso? Você pode tentar cortar os galhos da árvore, mas essa tática adianta apenas durante um curto período de tempo. Mais cedo ou mais tarde, os galhos começariam a crescer de novo, produzindo mais veneno.

As frutas venenosas, nessa analogia, representam todos os pensamentos e ações ilusórios que são responsáveis por mantê-lo preso à existência cíclica, forçando você a passar por sofrimento e decepção repetidamente. Cortar os galhos é como aplicar um antídoto temporário para essas ilusões – como combater o ódio praticando a paciência. Essas medidas ajudam em curto prazo, mas enquanto a fonte dessas ilusões (a árvore em si) permanecer de pé, as ilusões reaparecerão, mais cedo ou mais tarde.

A única maneira pela qual você pode ter certeza de que permanecerá completamente a salvo do perigo é cortar o tronco da árvore, de modo que nada nasça nunca mais dele. O tronco da árvore é a ignorância – a visão errônea sobre a maneira como você e as outras coisas existem.

Assim como você precisa de três coisas diferentes para cortar uma árvore (um machado afiado, uma mira certeira e um braço forte), também precisa de três treinamentos para se libertar do samsara. Esses três treinamentos funcionam juntos, da seguinte maneira:

O machado afiado: Sem um machado afiado, você não é capaz de cortar nada. Nesse caso, seu machado é a sabedoria que você desenvolve ao ouvir, examinar e, finalmente, meditar profundamente sobre os ensinamentos de Buda. Especificamente, você tem que desenvolver a sabedoria penetrante para ver diretamente que a noção de eu sólida e concreta à qual você tem se apegado é ilusória – uma falsa projeção de sua mente.

Uma mira certeira: Ter um machado afiado não é o suficiente. Para cortar o tronco da árvore, você precisa de uma mira certeira que ofereça a você a habilidade de atingir o mesmo lugar repetidas vezes. Se você bater em vários locais, nem mesmo o machado mais afiado lhe servirá. Apenas uma mente perfeitamente concentrada – que você desenvolve ao concentrar sua consciência, repetidas vezes, em um objeto de meditação determinado – pode oferecer a mira certeira necessária para manusear com eficácia o machado da sabedoria. Se sua atenção for negligente ou distraída, sua mira não será verdadeira, e sua sabedoria nunca penetrará.

Força: Você ainda não chegou ao fim. Se você não tiver a força física necessária, não será capaz de manusear o machado com precisão e potência. A mesma ideia vale para suas práticas espirituais. Você precisa da força que vem de seguir um regime de disciplina moral. Você não pode levar uma vida antiética, causando mal a si mesmo e aos outros, e esperar atingir o grau de concentração e compreensão necessários para eliminar a ignorância de sua mente.

Se você praticar os três treinamentos em combinação um com o outro, Buda afirmou que, definitivamente, você terá condições de acabar com a existência cíclica e vivenciar a paz inexpressível da libertação. Você não precisa morrer para alcançar o nirvana, mas precisa dominar sua mente. Dito de outra maneira: você precisa seguir o treinamento – primeiramente esboçado no caminho óctuplo revelado no primeiro discurso de Buda (que discutimos no Capítulo 3). Com a autodisciplina moral como sua base e uma concentração elevada oferecendo o foco, sua sabedoria pode interromper a ignorância e ajudá-lo a se libertar do ciclo de tristeza recorrente, nesta vida.

 

LANDAW, Jonathan. Budismo para leigos. – Rio de Janeiro: Alta Books, 2011p.259 - 260


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