O PODER DO TAO - LOU MARINOFF - anotações de leitura
Início: 28/04/2021
Término: 11/05/2021
MARINOFF, Lou (1952 - ) O poder do Tao. – 1ª. ed. São Paulo: Prumo, 2013.
“A escolha é um grande poder, mas
também uma grande responsabilidade. Por que? Porque todas as escolhas tem
consequências. Cada vez que toma uma decisão, você está estabelecendo uma
causa. E toda causa certamente gera um efeito, para melhor ou para pior”. P.14
“A ignorância não é uma benção, mas
sim um ensaio geral para o desgosto e a tristeza”. P.16
Saúde e felicidade estão relacionadas.
É mais fácil ser feliz quando se tem saúde; também é mais fácil a recuperação
se o seu estado de espírito é positivo em vez de negativo. Além disso, ser
feliz torna mais fácil manter a saúde. Pessoas deprimidas ou estressadas têm
seus sistemas imunológicos afetados e assim são mais suscetíveis a doenças.
P.23
Se você está infeliz, não pode estar
feliz.
Mas se está infeliz com sua
infelicidade, você pode começar a sentir-se novamente feliz.
Estar infeliz com a infelicidade abre
espaço para surgir a felicidade.
E estar feliz com a felicidade é
ótimo: não dá espaço para que a infelicidade reapareça.
p.26
Fumar
O cigarro tem matado “legalmente”
milhões de pessoas. As doenças causadas pela inalação da fumaça do cigarro
constituem grandes problemas de saúde; contudo, quase todos os fumantes acham
muito difícil (ou mesmo impossível) deixar de fumar. Na minha opinião, isto
acontece porque a razão básica para se fumar cigarros não foi identificada nem
abordada. Que tipo de hábito é esse? Ele tem muitos componentes, alguns dos
quais são bem conhecidos.
Em primeiro lugar, trata-se de um vício
em nicotina, que é um estimulante formador de hábito.
Em segundo lugar, é um meio de gratificação
oral que é mais importante durante a infância, mas o qual os seres humanos
nunca superam completamente.
Em terceiro, é uma forma de manter
nossos dedos ativamente coordenados, algo que teve um papel muito
importante na nossa evolução como macacos usuários de ferramentas; portanto,
ela nos dá prazer.
Quarto, trata-se de uma maneira de dominar
e utilizar fontes portáteis e confiáveis de fogo, um item da maior
importância na evolução humana; portanto, nosso cérebro está programado para
ser fascinado por ele - de fogueiras a fogos de artifício, de fósforos a
isqueiros.
Em quinto lugar, o hábito é uma espécie
de muleta social, que dá às pessoas uma desculpa para iniciar uma
conversa (e acender um fósforo).
Sexto, é uma espécie de símbolo de
status, ou pelo menos costumava ser, nos dias em que os astros de Hollywood
fumavam sem parar durante os filmes e inspiravam o público a fazer o mesmo.
Todos esses fatores levam as pessoas a
fumar cigarros, mesmo sabendo que isso é prejudicial. Fumar é sedutor em
muitos aspectos, o que ajuda a explicar por que é tão difícil deixar o hábito.
Se você usar um adesivo com nicotina irá satisfazer o desejo pela droga, mas
não as outras dimensões. Os domínios oral, manual, primai e social também
precisam estar engajados.
As pessoas que deixam de fumar muitas
vezes engordam, porque manusear, cozinhar e comer também envolve todas essas
outras dimensões. Também conheço muitas pessoas que voltaram a fumar porque preferiam
ser fumantes magras do que não fumantes gordas.
No curto prazo, um cigarro satisfaz
tantas necessidades humanas em tantos níveis que é difícil resistir a ele. Mas
no longo prazo é um vício que mata, lenta, mas infalivelmente.
LOU MARINOFF. O poder do Tao. P.30-31
p. 87 - O seres humanos são destinados - ou condenados, dependendo do seu ponto de vista - a trabalhar.
TRIO
DE PRAGAS
Precisamos prestar muita atenção ao Tao,
que só pode ser descrito de forma alusiva, ou deixaremos de entender o
significado dos seus ensinamentos. O yin e o yang estão constantemente dançando
e trocando de identidade um com o outro. O pensamento chinês também é assim:
algumas vezes - como no caso do médico - as coisas significam o complemento
daquilo que parecem estar querendo dizer. Se “volte no próximo ano” pode
significar “você tem um ano de vida”, então é melhor ter muito cuidado ao
decodificar Lao Tzu. Afinal, ele foi um metafísico perfeito para pessoas e
também culturas.
Na mesma linha, há um trio de pragas
chinesas que podem parecer um tanto atraentes para ouvidos não treinados. A
primeira delas, que você provavelmente já ouviu, é: “Que você viva em tempos interessantes”. Sim, mas o que torna os
tempos interessantes? O período mais interessante pode ser o mais angustiante
para atravessar. Entendeu? A segunda maldição, que poucos ouviram, é: “Que o governo esteja consciente de você”.
Embora isto possa parecer desejável, no sentido de ter honras ou poderes
concedidos a você, também há um toque ameaçador, em especial em estados
totalitários. E qual é a terceira maldição? “Que você consiga aquilo que quer.” Por que é uma maldição? Por
duas razões. Primeira, as coisas que desejamos têm atadas a elas cordões
invisíveis, que nunca enxergamos até que seja tarde demais. Tão logo obtemos o
que desejamos, descobrimos de repente que aquilo vem preso a todas as coisas
que não queremos, mas agora estão conosco. Segunda, conseguir aquilo que
queremos infla o ego e conduz a novos desejos.
O objetivo dessas observações é
esclarecer os versos de Lao Tzu a respeito de casamento e família e, além
disso, saber como se ligam às esferas social e política.
Toda civilização se baseia em quatro
pilares: casamento, família, sociedade e organização política. Se eles
permanecerem sólidos, a maioria das pessoas irá conhecer felicidade e a
civilização irá florescer. Mas se qualquer um desses pilares se romper, as
pessoas - provavelmente muitas - irão se tornar infelizes e o edifício da sua
civilização correrá o risco de ruir. Lembre-se, Lao Tzu e Confúcio viveram em
tempos “interessantes” e vários governos estavam “conscientes” deles. P.117
Teodiceia
e Psicodiceia?
Sua bondade é determinada por sua
vontade de ser bom e nada mais. Isto distingue o Tao de todas as religiões do
mundo. Como vimos, ‘religere’ significa “ligar” e isto é o que fazem todas as
religiões; elas ligam sua alma interior a uma divindade exterior. Por
definição, a Divindade é todo poder (onipotente), toda sabedoria (onisciente) e
toda bondade (onibenevolente). Mas como sabem os filósofos e os teólogos, isto
cria uma contradição insolúvel, conhecida no ocidente como “problema da
Teodiceia” É assim: se Deus é onipotente, onisciente e todo bondade, por que
permite a existência do mal? Por que simplesmente não erradica a maldade? Toda
religião precisa responder a esta pergunta e nenhuma pode respondê-la sem
propor uma próxima vida, uma vida depois da morte ou algum estado de coisas
futuro que irá equilibrar todo o mal com bondade, todos os atos ruins com
retidão, toda injustiça com o julgamento divino.
Embora essas explicações possam ser
bem-intencionadas e possam oferecer esperança e consolo, elas também preparam
as pessoas para sofrer e infligir sofrimento a si mesmas e aos outros, de uma
geração para a seguinte, em nome de um futuro que poderá nunca chegar.
Como as religiões não podem resolver o
problema da Teodiceia no presente, elas são obrigadas a concluir que sofrer é
necessário. O sofrimento no presente torna-se seu passaporte para o paraíso
futuro. Mas enquanto isso, você está condenado a sofrer. No final do século XX,
milhões de ocidentais desiludidos haviam rejeitado esta “solução” para seus sofrimentos.
Gradual ou rapidamente, as pessoas perderam a fé e buscaram explicações
alternativas. Até mesmo Eli Wiesel, um antigo crente devoto, que havia sido
criado para reverenciar Deus, teve sua fé quase exterminada pelo Holocausto.
Depois de ter sobrevivido a Auschwitz e a alguns dos piores males que os seres
humanos são capazes de infligir uns aos outros, hoje ele diz: “Precisamos nos
comportar como se houvesse um Deus”. Como se houvesse um Deus está muito
distante de acreditar que existe um.
Ao mesmo tempo, as filosofias ateístas
de Marx ao existencialismo entraram em moda, apesar de certamente não tornarem
as pessoas mais felizes. Os existencialistas estão entre as pessoas mais
deprimidas que conheço, enquanto os marxistas estão entre as mais descontentes
do planeta. Muitas pessoas que perdem a fé tornam-se tremendamente amargas
como aquele filósofo ateísta que conheço (e ele não está só) que disse que, se
Deus existe, então deve ser um maníaco sádico. Este tipo de ateísmo não é
exatamente uma receita para a felicidade. Além disso, se Deus existe e é um
maníaco sádico, então deve ser um deus muito infeliz.
Lao Tzu não se opunha à religião. Na
verdade, ele e Confúcio reconheciam o valor inerente das práticas rituais e
devocionais, que todas as religiões incorporam. Rituais e devoções podem ser
belos e costumam ser acompanhados por músicas comoventes. Dão significado a
nossas vidas, emprestam ritmo a ciclos sazonais, realçam a comemoração de
ocasiões especiais e enobrecem nossa existência. Mas se as instituições
religiosas se tornam corruptas, seus devotos sofrem. Foi isto que Lao Tzu
procurou evitar. Através do exercício da boa vontade, você também resiste à corrupção,
quer acredite ou não em Deus.
Por outro lado, muitos pesquisadores
sucumbiram à psicologia ocidental, que lhes oferece uma abordagem diferente e
mais nova. Você sofre hoje por causa de coisas que lhe aconteceram no passado.
Se pudermos imaginar o que aconteceu a você no passado, poderemos descobrir o
que está causando seu atual sofrimento. Caso possamos fazê-lo, poderemos
ajudá-lo a cortar os elos com sua cadeia de eventos do passado. Então, seu
sofrimento acabará e você estará curado. Essa é a teoria.
Este mito psicológico é quase tão
sedutor quanto o religioso. E é por isso que dezenas de milhões de pessoas
investiram bilhões de horas e trilhões de dólares em psicoterapia e
psicanálise, exatamente como costumavam investir (e outros ainda investem)
tempo e fortunas em orações e templos. Além disso, os ocidentais estão
consumindo quantidades sem precedentes de medicamentos e se tornando mais
infelizes a cada dia que passa. Por quê? Porque esta espécie de psicologia está
distante do Tao, uma vez que oculta sua própria versão do problema da
Teodiceia. Como ninguém deu um nome a este “bebê”, permita que eu o faça. Vou
chamá-lo de “problema da Psicodiceia”. Lembre-se de que o problema da Teodiceia
será “resolvido” em algum ponto do futuro, mas enquanto isso as pessoas estão
condenadas a sofrer. Da mesma maneira, o problema da Psicodiceia foi
“resolvido” em algum ponto do passado, mas enquanto isso as pessoas estão
condenadas a sofrer hoje.
O problema da Psicodiceia é assim: seu
sofrimento atual é causado pelo passado. Mas este passado nunca é totalmente
explicado. E é por isso que você continua a sofrer, mesmo que já tenha feito
semanas, meses ou anos de psicoterapia. Você irá precisar de muito mais
semanas, meses e anos para explicar melhor o passado. Então, seu sofrimento
supostamente estará curado. Mas espere um instante: agora existe outro
problema. Enquanto está gastando todas essas semanas, meses e anos com
psicoterapia, você estará acumulando mais e mais do passado! Coisas novas
continuam acontecendo e imediatamente se tornam coisas do passado, que por
definição podem fazê-lo sofrer. Assim, elas também devem ser explicadas. E
assim sua psicoterapia nunca termina, nem seu sofrimento.
Acha que estou brincando? Então pense
duas vezes. Você conhece a primeira lei de Newton? “Um objeto em repouso irá
permanecer em repouso até que sofra a ação de uma força desequilibrada.” Isto
vem diretamente do Tao. A mente taoísta é como um objeto em repouso. Pelo fato
de estar em repouso, ela pode realizar tudo. Lembre-se do princípio do
vou-voei: ação através de inércia. Além disso, a mente do taoísta permanece em
repouso, porque ele não permite que ela seja afetada por forças
desequilibradas. Supostamente a psicoterapia ajuda a equilibrar mentes
desequilibradas, mas devido ao problema da Psicodiceia, ela pode se tornar mais
uma força desequilibrada. A psicoterapia pode agitar as emoções em vez de
acalmar a mente.
Você conhece a primeira lei da
psicoterapia? Eu a aprendi com Irvin Yalom, um dos maiores psicoterapeutas do
mundo. Estávamos tomando café e conversando em San Francisco quando ele disse:
“Sempre há mais alguma coisa”. É por isso que a psicoterapia nunca termina.
Sempre há mais alguma coisa, alguma força desequilibrada ainda não explicada,
pra impedir sua mente de permanecer em repouso.
O problema da Psicodiceia é exposto por
Laurence Sterne em seu livro Tristram Shandy. Pobre Tristram, o protagonista
bem-intencionado, está tentando conscientemente escrever sua autobiografia. O
problema é que ele demora um ano para registrar fielmente os eventos de apenas
um dia. Assim ele nunca poderá terminar, mesmo que viva para sempre. O mesmo
vale para a psicoterapia: nunca pode terminar. Quanto mais você vive, maior é o
seu passado. Quanto maior seu passado, mais longa a explicação necessária para
definir por que você está sofrendo hoje. A religião pode fazer as pessoas
sofrerem declarando que a cura para o sofrimento está no futuro. A psicologia
também pode fazer as pessoas sofrerem declarando que a cura para o sofrimento
está no passado. Até mesmo o budismo pode causar sofrimento declarando que ele
é um passo necessário no sentido da ausência de sofrimento. Mas o Tao alivia o
sofrimento diretamente, declarando que ele não é necessário. Se você sofre,
diz Lao Tzu, é porque está infligindo a você mesmo maldade, incorreção ou
injustiça. Uma vez que reconheça essas coisas, o que pode ser mais fácil de
falar do que de fazer, você poderá optar por imergir em bondade, correção e
justiça. Então, seu sofrimento irá passar imediatamente. E se você fizer outros
sofrerem, estará prejudicando a eles e, portanto, a si mesmo, causando ainda
mais sofrimento desnecessário.
A maneira mais rápida de terminar com
seu sofrimento é exercer a bondade com os outros, praticar correção com eles e
tratá-los com justiça. Então, o sofrimento deles irá diminuir e o seu será
aliviado imediatamente, graças ao poder do Tao.
p.132 – 135
As pessoas de boa vontade são gratas
pelo fato dos tempos ruins não poderem persistir para sempre, enquanto as
pessoas de má vontade costumam fazer o possível para acabar com a bondade, o
que felizmente nunca conseguem fazer. P.135
Tao
da Correção
A tarefa de um navegador é
manter uma nave no curso e fazer recomendações sempre que ela se afastar do
mesmo - seja devido aos elementos ou a um erro - ou caso ela precise evitar um
obstáculo no seu caminho. Um bom navegador gosta de sua nave e quer que ela
permaneça no curso, não porque assim ele será reconhecido como bom navegador,
mas sim para assegurar a segurança da nave e dos seus passageiros e sua chegada
ao destino no horário previsto. Espera-se que um bom navegador faça correções;
essa é a razão pela qual ele está a bordo. E quando um navegador faz isso bem,
dificilmente alguém irá perceber que foi feita uma correção.
Correções drásticas são
necessárias somente se a nave se desviou demais do curso, ponto em que todos
percebem que alguma coisa está errada.
Lao
Tzu reconheceu que é muito mais fácil corrigir um problema no seu início, em
vez de adiar, negá-lo ou esperar que ele fique pior. Isto vale nas esferas
social, pessoal, médica e política e é totalmente compatível com a estratégia
preventiva do Tao.
MARINOFF, Lou (1952 - ) O poder do
Tao. – 1ª. ed. São Paulo: Prumo, 2013. p.139
Gengis
Kahn encontra o Tao
O grande e poderoso Gengis Kahn forjou o
estupendo Império Mongol - uma série arrebatadora de conquistas tão grandiosas
como o mundo jamais havia visto - ainda que sua duração fosse relativamente
curta. Seu neto, Kublai Khan, fundou a dinastia Yuan na China. No apogeu de seu
poderio, o imperador Gengis Khan governou uma área vasta e contínua de terra
que se estendia do Mar da China até o rio Danúbio.
Entretanto, nas palavras do poeta Robert
Browning, “o esforço de um homem deve exceder seu alcance”, e mesmo o ilustre
Gengis Khan não escapou disso. Como qualquer indivíduo comum, ele também teve
aspirações malogradas e sonhos não realizados. Porém, como todo homem
extraordinário, suas aspirações e sonhos eram excepcionalmente difíceis de
concretizar. Aos 60 anos, no auge do poder e no ápice da carreira, cedeu à
preocupação de que não viveria tempo suficiente para cumprir seu destino. A
ideia da própria mortalidade pesava-lhe tremendamente, de modo que o grande
Gengis Kahn buscou uma maneira de prolongar a vida. Entretanto ninguém do seu
círculo de familiares ou amigos, assessores ou aliados, estrategistas ou
xamãs, conseguiu lhe oferecer conselhos satisfatórios sobre o eterno desafio de
enganar a morte. Ele consultou cristãos, muçulmanos, budistas, zoroastristas,
em vão.
Por fim mandou emissários convocarem o
homem mais erudito de todo o seu reino, um velho sábio taoísta de setenta e
dois anos chamado Ch’ang-ch’um. Tão lendário aquele taoísta se tornara, que
recusara um convite semelhante da corte da dinastia Song, no sul da China. Mas
o convite para visitar e orientar Gengis Kahn não podia ser declinado
levianamente e assim o sábio idoso se lançou da península Shandong até as
profundezas de Hindu Kush e de volta, uma odisseia que consumiria quatro anos e
mais de 16 mil quilômetros. Sua incrível jornada, narrada em chinês por um
discípulo, foi traduzida para o inglês no século XX por Arthur Waley e
publicada com o título The Traveis of an Alchemist (As viagens de um
alquimista).
Quando enfim se encontraram, Ch’ang-ch’un
não se ajoelhou ou mesmo se inclinou perante o grande Gengis Kahn. Tão
conceituados eram os mais renomados sábios taoístas (e confucianistas e
budistas) que eles não se ajoelhavam, nem na presença de imperadores. Seu poder
espiritual era visto como maior do que o poder temporal dos governantes.
Sincero, Ch’ang-ch’un disse a Gengis Kahn que o poder do Tao poderia, com certeza,
proteger a sua vida - isto é, expandir a qualidade -, porém não garantiria o
seu prolongamento. Kahn, que comandava um vasto império, não tinha ideia de
como dominar o poder do Tao e concordou em aprender com Ch’ang-ch’un.
Eis a essência do conselho de
Cfrang-clfun: “Evite excessos, extravagâncias e complacência. Qualidade de
vida, aliada à suprema serenidade, fluem do equilíbrio. Infelicidade,
frustração, raiva e todos os outros tormentos fluem do desequilíbrio. Os
pontos-chave para uma vida equilibrada incluem quietude, autodomínio e
meditação”. É claro que, até então, tais práticas não haviam ocupado espaço na
agenda diária do homem mais poderoso do mundo. Ao buscar exercer o domínio
sobre todos os homens com exceção de si mesmo, Gengis Kahn sofrerá. Por outro
lado, ao alcançar o autodomínio sem aspirar nada dos outros, Ch’ang-ch’un
encontrara a serenidade. De modo que o sábio taoísta pôs-se a instruir Gengis
Kahn quanto aos hábitos e estados de espírito propícios a uma vida de
qualidade.
Gengis Kahn, como o seu império, padecia
de um excesso de yang. Todavia Gengis Kahn tinha que cumprir o seu destino e
Ch’ang-ch’un (a exemplo de seu mestre Lao Tzu) não o censurou por ele ser quem
era. Conforme Lao Tzu escreveu: “Quando é para um homem tomar o mundo e
moldá-lo, entendo que deva ser obrigado a fazê-lo”. No entanto o desequilíbrio
na vida de Gengis Kahn inevitavelmente se refletiu em seu império, que se
desintegrou tão rapidamente quanto se aglutinou. O excesso de yang fez seu
império duro, mas frágil. Desprovido de yin, faltou-lhe flexibilidade
suficiente para perdurar muito tempo.
Este é sempre o preço de ignorar o Tao.
Assim os sábios taoístas se esforçam para manter o equilíbrio, porque o
excesso, invariavelmente, vem atrelado ao seu complemento, a escassez. Isto era
verdade para Gengis Kahn e é também verdade para você e para mim, porque o
Caminho governa a todos nós. Siga o seu caminho com sabedoria e você
prosperará. Percorra-o imprudentemente e pagará caro. A escolha é sua.
Muitos de nós, no Ocidente, têm
descartado esses pontos-chave ou os trocado pelo consumismo descuidado e pela
autoindulgência. Se e quando mais ocidentais se aterem a esses pontos-chave,
eles irão descobrir que o poder do Tao abre os portões que conduzem a uma vida
de equilíbrio, serenidade e qualidade. P.150 - 151
“Inúmeras
tradições filosóficas sábias como o budismo, estoicismo e budismo, ensinam
práticas poderosas que nos ajudam a manter o equilíbrio das emoções, porém nem
assim alguém é capaz de garantir a absoluta segurança emocional”. P.153
O Tao
nos ensina não como prolongar o tempo de vida, mas como aperfeiçoar a sua
qualidade. Ao descobrir o valor e a qualidade, você experimentará a felicidade.
Ao reforçar, gradualmente, esse tipo de felicidade, você se tornará sereno.
Você conhecerá o valor de tudo e saberá que há coisas que não tem preço. P.157
Quais
são as coisas mais valiosas da vida? O Tao Te Ching nos recomenda: um trabalho
significativo, relacionamentos amorosos, laços familiares estreitos, comunidades
de apoio, estilo de vida simples, um ambiente harmonioso e a apreciação da
natureza. Essas coisas são extremamente valiosas e também inestimáveis: não
podem ser compradas com dinheiro. Elas são obtidas seguindo o Tao. P.158
“Estados mentais degradados ajudam a criar ambientes
degradados,
estados mentais e ambientes tóxicos,
estados mentais e ambientes profanados,
estados mentais e ambientes desunidos”.
p. 216
O Oposto de um Filósofo
Alguma
coisa a mais está em ação aqui, contra a qual a psicologia luta, mas ainda não
inventou. Trata-se de um fenômeno estranho, que você já deve ter notado. Ou
pelo menos irá notar quando eu mencioná-lo. Recentemente, em um jantar, fui
apresentado a um convidado chamado Robert. Ele era muito conhecido e também
respeitado, em especial por muitas pessoas com história demais. Mas como minha
história é curta, eu não tinha ouvido falar nele. Mas ele havia ouvido falar de
mim. Quando lhe perguntei: “O que você faz?” ele respondeu: “Sou o oposto de
você”. Aquilo pareceu estranho. “O que é o oposto de um filósofo?” perguntei.
“Um jornalista”, respondeu ele. Nós dois rimos, mas na verdade o assunto não
era para rir. Robert escreve uma coluna muito conhecida para um famoso jornal
que eu raramente lia. Por que não? Porque, como diz ele, o jornalismo é o
oposto da filosofia. O que significa isso?
Filosofia
significa “amor pela sabedoria”. Assim, seu oposto poderia ser “ódio pela
sabedoria” ou “amor pela estupidez”. Robert não parecia odioso; então, talvez
fosse um amante da estupidez. O que isto significa? Por um lado, filósofos
escrevem textos que duram séculos, ou mesmo milênios (como o Tao Te Ching de
Lao Tzu, por exemplo); esses textos são lidos e relidos, estudados
repetidamente. Em contraste os jornalistas, em sua maioria, escrevem textos que
duram o dia em que são impressos, sendo a seguir descartados e esquecidos como
se nunca tivessem existido. Muitas pessoas colecionam livros velhos; a maioria
joga fora os jornais velhos. Esse é certamente um oposto da filosofia. Mais uma
vez, muitos jornalistas têm muitos leitores: milhões de pessoas leem suas colunas,
que talvez levem algumas horas ou dias para ser escritas. Em contraste, muitos
filósofos têm sorte quando vendem dez exemplares do seu livro mais recente (e
suas mães compram nove deles), um livro que provavelmente demorou muitos anos
para ser escrito. Sem dúvida, um é oposto do outro.
Robert
tinha uma mente inquiridora e acredito que pretendesse uma coisa muito
diferente como “oposto” da filosofia. Os maiores filósofos do mundo - inclusive
Lao Tzu, Buda e Sócrates - eram todos serenos. Amar a sabedoria da maneira
certa não pode deixar de induzir felicidade, e assim esses amantes da sabedoria
também tornaram muitas outras pessoas felizes. O jornalismo é diferente, porque
a regra básica que rege a mídia de massa é: “Más notícias vendem mais que boas
notícias”. Os magnatas da mídia sabem isso, e também seus editores e
jornalistas, além dos consumidores.
Há uma
história famosa a respeito de William Randolph Hearst, o conhecido fundador da
Hearst Corporation. Certa vez ele enviou um ilustrador (nos tempos anteriores
à fotografia comercial) a Cuba para cobrir a Guerra Hispano-Americana. Quando o
artista lá chegou, não viu guerra nenhuma e enviou um telegrama a Hearst
comunicando o fato. Hearst enviou-lhe uma resposta apócrifa: “Você fornece as
ilustrações. Eu fornecerei a guerra”. A guerra vende muito mais jornais que a
paz. A paz promete a felicidade muito mais que a guerra. Também Robert estava
cobrindo más notícias em suas colunas, que geravam grandes manchetes e também
tornavam as pessoas infelizes. Eu cubro ideias atemporais, que não geram manchetes,
mas tornam as pessoas felizes. Talvez fosse isso que Robert quis dizer quando
nos chamou de opostos.
Mas a
pergunta permanece: por que más notícias vendem mais que as boas? Os psicólogos
têm enchido bibliotecas respondendo isso. Alguns, como Freud, convenceram
muitas pessoas de que nós, seres humanos, temos um “lado escuro” que eclipsa
nossa luz interior, nos tornando suscetíveis acima de tudo às más notícias.
Enquanto as coisas ruins acontecem para outras pessoas, supostamente
experimentamos uma mistura de fascínio horrorizado e alívio porque elas não
aconteceram a nós. Essa é uma teoria, mas ela está longe de ser completa. Por
exemplo, ela não explica a culpa do sobrevivente, que muitas pessoas sentem. E
não explica os bons samaritanos: pessoas de boa vontade e ação decisiva que,
tão logo ocorre a tragédia, reagem à ocasião e oferecem ajuda imediata, mesmo
que isso ponha em risco suas próprias vidas.
Um
taoísta poderia fazer esta pergunta: por que alimentos ruins (em outras
palavras, junkfood) vendem melhor que alimentos bons (isto é, saudáveis)? Isto
certamente acontece por uma série de razões, inclusive maus hábitos, ignorância
a respeito de nutrição e um constante bombardeio publicitário pela TV e outros
veículos. Se os consumidores adquirem hábitos nocivos por ignorância e
sucumbem a comerciais feitos por quem só está em busca de lucro com sua saúde
prejudicada, então esses consumidores se perderam do Tao. Seus blocos foram
esculpidos em formas obesas e assim eles sofrem. Mas não há nenhuma lei
objetiva de psicologia que os obriga a sofrer. Tão logo eles começarem a agir
de acordo com o Tao, seus hábitos irão melhorar e sua ignorância irá
desaparecer e eles começarão a reverter para o Bloco Não Esculpido. Eles irão
consumir porções modestas de bons alimentos, em vez de grotescas montanhas de
comida ruim.
Como
eles irão tomar consciência do Tao? Como bem sabem os jornalistas, ele não
gera manchetes. Há duas maneiras para que a consciência do Tao se espalhe: de
cima para baixo ou de baixo para cima. Qualquer delas funciona e pode dar
origem a uma era de ouro. Para que o Tao se espalhe de cima para baixo,
precisamos de governantes esclarecidos; de baixo para cima, de iniciativas de
base. Foi por isso que Confúcio procurou aconselhar os líderes militares,
persuadindo-os a governar de acordo com o Tao em vez da coerção explícita. E
foi por isso que Lao Tzu escreveu o Tao Te Ching: aconselhar cidadãos comuns
(começando pelo guarda de fronteira que implorou que ele o escrevesse),
mostrando-lhes como seguir Tao, criando assim sua própria era de ouro. P.230 -
232
Como
sabia Lao Tzu, quando os governantes não obedecem o Tao, precisamos depender
das próprias pessoas, que sempre podem agir a partir de seus movimentos
espontâneos. Quando nem governos (o setor público) nem corporações (o setor
privado) fazem aquilo que deve ser feito para curar o mundo, as pessoas comuns
(a sociedade civil) podem e devem enfrentar o desafio. É por isso que estamos
testemunhando a proliferação de ONGs surgidas na sociedade civil, que estão
fazendo o bem em todo o mundo. Ninguém precisa sentir-se impotente diante de
governos rígidos e grandes empresas.p.234
Platão
e George Orwel, cada um à sua maneira, alertaram que é possível abusar da
linguagem – isto é, ela pode ser usada para distorcer realidades, inflamar
emoções e agitar comportamentos – para o controle social e político das massas,
mas não para benefício delas. P.242
Ficar
só é maravilhoso e fortalecedor; não é o mesmo que estar solitário. E como você
já sabe, às vezes não existe um lugar mais solitário que uma multidão. P.248
Lembre-se,
sempre há um guia dentro de você, seu Sábio interior. Enquanto escolher a
sabedoria e não a loucura, você ouvirá sua voz. E algumas vezes você precisa
estar perdido para ouvi-lo de forma mais clara. O caminho que você busca já
está na sua mente e no seu coração. O desafio não é encontrá-lo, mas sim
refutar os pensamentos e sentimentos que o obscurecem. Para isso, ouça Lao Tzu:
“Quem se compromete com o Tao é identificado com Tao...Se está identificado com
Tao, será bem recebido por ele”. P.253
“A harmonia é alcançada por meio do
equilíbrio da diversidade e não pela imposição da uniformidade. As mudanças,
paradoxalmente, constituem a única constante da vida”.
O grande e poderoso Gengis Kahn forjou o
estupendo Império Mongol - uma série arrebatadora de conquistas tão grandiosas
como o mundo jamais havia visto - ainda que sua duração fosse relativamente
curta. Seu neto, Kublai Khan, fundou a dinastia Yuan na China. No apogeu de seu
poderio, o imperador Gengis Khan governou uma área vasta e contínua de terra
que se estendia do Mar da China até o rio Danúbio.
Entretanto, nas palavras do poeta Robert
Browning, “o esforço de um homem deve exceder seu alcance”, e mesmo o ilustre
Gengis Khan não escapou disso. Como qualquer indivíduo comum, ele também teve
aspirações malogradas e sonhos não realizados. Porém, como todo homem
extraordinário, suas aspirações e sonhos eram excepcionalmente difíceis de
concretizar. Aos 60 anos, no auge do poder e no ápice da carreira, cedeu à
preocupação de que não viveria tempo suficiente para cumprir seu destino. A
ideia da própria mortalidade pesava-lhe tremendamente, de modo que o grande
Gengis Kahn buscou uma maneira de prolongar a vida. Entretanto ninguém do seu
círculo de familiares ou amigos, assessores ou aliados, estrategistas ou
xamãs, conseguiu lhe oferecer conselhos satisfatórios sobre o eterno desafio de
enganar a morte. Ele consultou cristãos, muçulmanos, budistas, zoroastristas,
em vão.
Por fim mandou emissários convocarem o
homem mais erudito de todo o seu reino, um velho sábio taoísta de setenta e
dois anos chamado Ch’ang-ch’um. Tão lendário aquele taoísta se tornara, que
recusara um convite semelhante da corte da dinastia Song, no sul da China. Mas
o convite para visitar e orientar Gengis Kahn não podia ser declinado
levianamente e assim o sábio idoso se lançou da península Shandong até as
profundezas de Hindu Kush e de volta, uma odisseia que consumiria quatro anos e
mais de 16 mil quilômetros. Sua incrível jornada, narrada em chinês por um
discípulo, foi traduzida para o inglês no século XX por Arthur Waley e
publicada com o título The Traveis of an Alchemist (As viagens de um
alquimista).
Quando enfim se encontraram, Ch’ang-ch’un
não se ajoelhou ou mesmo se inclinou perante o grande Gengis Kahn. Tão
conceituados eram os mais renomados sábios taoístas (e confucianistas e
budistas) que eles não se ajoelhavam, nem na presença de imperadores. Seu poder
espiritual era visto como maior do que o poder temporal dos governantes.
Sincero, Ch’ang-ch’un disse a Gengis Kahn que o poder do Tao poderia, com certeza,
proteger a sua vida - isto é, expandir a qualidade -, porém não garantiria o
seu prolongamento. Kahn, que comandava um vasto império, não tinha ideia de
como dominar o poder do Tao e concordou em aprender com Ch’ang-ch’un.
Eis a essência do conselho de
Cfrang-clfun: “Evite excessos, extravagâncias e complacência. Qualidade de
vida, aliada à suprema serenidade, fluem do equilíbrio. Infelicidade,
frustração, raiva e todos os outros tormentos fluem do desequilíbrio. Os
pontos-chave para uma vida equilibrada incluem quietude, autodomínio e
meditação”. É claro que, até então, tais práticas não haviam ocupado espaço na
agenda diária do homem mais poderoso do mundo. Ao buscar exercer o domínio
sobre todos os homens com exceção de si mesmo, Gengis Kahn sofrerá. Por outro
lado, ao alcançar o autodomínio sem aspirar nada dos outros, Ch’ang-ch’un
encontrara a serenidade. De modo que o sábio taoísta pôs-se a instruir Gengis
Kahn quanto aos hábitos e estados de espírito propícios a uma vida de
qualidade.
Gengis Kahn, como o seu império, padecia
de um excesso de yang. Todavia Gengis Kahn tinha que cumprir o seu destino e
Ch’ang-ch’un (a exemplo de seu mestre Lao Tzu) não o censurou por ele ser quem
era. Conforme Lao Tzu escreveu: “Quando é para um homem tomar o mundo e
moldá-lo, entendo que deva ser obrigado a fazê-lo”. No entanto o desequilíbrio
na vida de Gengis Kahn inevitavelmente se refletiu em seu império, que se
desintegrou tão rapidamente quanto se aglutinou. O excesso de yang fez seu
império duro, mas frágil. Desprovido de yin, faltou-lhe flexibilidade
suficiente para perdurar muito tempo.
Este é sempre o preço de ignorar o Tao.
Assim os sábios taoístas se esforçam para manter o equilíbrio, porque o
excesso, invariavelmente, vem atrelado ao seu complemento, a escassez. Isto era
verdade para Gengis Kahn e é também verdade para você e para mim, porque o
Caminho governa a todos nós. Siga o seu caminho com sabedoria e você
prosperará. Percorra-o imprudentemente e pagará caro. A escolha é sua.
Muitos de nós, no Ocidente, têm
descartado esses pontos-chave ou os trocado pelo consumismo descuidado e pela
autoindulgência. Se e quando mais ocidentais se aterem a esses pontos-chave,
eles irão descobrir que o poder do Tao abre os portões que conduzem a uma vida
de equilíbrio, serenidade e qualidade. P.150 - 151
O TDAH é uma epidemia social causada por doses excessivas de televisão, videogames, surfs na web e pelas redes sociais, associados ao abandono da leitura, da escrita, do raciocínio e da disciplina. Como as iogas indianas, as artes marciais asiáticas melhoram a concentração e o autocontrole - as coisas das quais carecem as crianças com TDAH de uma vez por todas, ao passo que drogar diariamente milhões de crianças com Ritalina não cura nada. Drogar as crianças em massa serve somente para destacar como nossa cultura está doente.
Quando mais pessoas levarem a sério as lições de Lao Tzu e aprenderem a mobilizar suas forças morais e vitais, inevitavelmente irão se tornar mais saudáveis e felizes. p.208
Alguma coisa a mais está em ação aqui,
contra a qual a psicologia luta, mas ainda não inventou. Trata-se de um
fenômeno estranho, que você já deve ter notado. Ou pelo menos irá notar quando
eu mencioná-lo. Recentemente, em um jantar, fui apresentado a um convidado
chamado Robert. Ele era muito conhecido e também respeitado, em especial por
muitas pessoas com história demais. Mas como minha história é curta, eu não
tinha ouvido falar nele. Mas ele havia ouvido falar de mim. Quando lhe
perguntei: “O que você faz?” ele respondeu: “Sou o oposto de você”. Aquilo
pareceu estranho. “O que é o oposto de um filósofo?” perguntei. “Um jornalista”,
respondeu ele. Nós dois rimos, mas na verdade o assunto não era para rir.
Robert escreve uma coluna muito conhecida para um famoso jornal que eu
raramente lia. Por que não? Porque, como diz ele, o jornalismo é o oposto da
filosofia. O que significa isso?
Filosofia significa “amor pela
sabedoria”. Assim, seu oposto poderia ser “ódio pela sabedoria” ou “amor pela
estupidez”. Robert não parecia odioso; então, talvez fosse um amante da
estupidez. O que isto significa? Por um lado, filósofos escrevem textos que
duram séculos, ou mesmo milênios (como o Tao Te Ching de Lao Tzu, por
exemplo); esses textos são lidos e relidos, estudados repetidamente. Em
contraste os jornalistas, em sua maioria, escrevem textos que duram o dia em
que são impressos, sendo a seguir descartados e esquecidos como se nunca
tivessem existido. Muitas pessoas colecionam livros velhos; a maioria joga fora
os jornais velhos. Esse é certamente um oposto da filosofia. Mais uma vez,
muitos jornalistas têm muitos leitores: milhões de pessoas leem suas colunas,
que talvez levem algumas horas ou dias para ser escritas. Em contraste, muitos
filósofos têm sorte quando vendem dez exemplares do seu livro mais recente (e
suas mães compram nove deles), um livro que provavelmente demorou muitos anos
para ser escrito. Sem dúvida, um é oposto do outro.
Robert tinha uma mente inquiridora e
acredito que pretendesse uma coisa muito diferente como “oposto” da filosofia.
Os maiores filósofos do mundo - inclusive Lao Tzu, Buda e Sócrates - eram todos
serenos. Amar a sabedoria da maneira certa não pode deixar de induzir
felicidade, e assim esses amantes da sabedoria também tornaram muitas outras
pessoas felizes. O jornalismo é diferente, porque a regra básica que rege a
mídia de massa é: “Más notícias vendem mais que boas notícias”. Os magnatas da
mídia sabem isso, e também seus editores e jornalistas, além dos consumidores.
Há uma história famosa a respeito de
William Randolph Hearst, o conhecido fundador da Hearst Corporation. Certa vez
ele enviou um ilustrador (nos tempos anteriores à fotografia comercial) a Cuba
para cobrir a Guerra Hispano-Americana. Quando o artista lá chegou, não viu
guerra nenhuma e enviou um telegrama a Hearst comunicando o fato. Hearst enviou-lhe
uma resposta apócrifa: “Você fornece as ilustrações. Eu fornecerei a guerra”. A
guerra vende muito mais jornais que a paz. A paz promete a felicidade muito
mais que a guerra. Também Robert estava cobrindo más notícias em suas colunas,
que geravam grandes manchetes e também tornavam as pessoas infelizes. Eu cubro
ideias atemporais, que não geram manchetes, mas tornam as pessoas felizes.
Talvez fosse isso que Robert quis dizer quando nos chamou de opostos.
Mas a pergunta permanece: por que más
notícias vendem mais que as boas? Os psicólogos têm enchido bibliotecas
respondendo isso. Alguns, como Freud, convenceram muitas pessoas de que nós,
seres humanos, temos um “lado escuro” que eclipsa nossa luz interior, nos
tornando suscetíveis acima de tudo às más notícias. Enquanto as coisas ruins
acontecem para outras pessoas, supostamente experimentamos uma mistura de fascínio
horrorizado e alívio porque elas não aconteceram a nós. Essa é uma teoria, mas
ela está longe de ser completa. Por exemplo, ela não explica a culpa do
sobrevivente, que muitas pessoas sentem. E não explica os bons samaritanos:
pessoas de boa vontade e ação decisiva que, tão logo ocorre a tragédia, reagem
à ocasião e oferecem ajuda imediata, mesmo que isso ponha em risco suas
próprias vidas.
Um taoísta poderia fazer esta pergunta:
por que alimentos ruins (em outras palavras, junkfood) vendem melhor que
alimentos bons (isto é, saudáveis)? Isto certamente acontece por uma série de
razões, inclusive maus hábitos, ignorância a respeito de nutrição e um
constante bombardeio publicitário pela TV e outros veículos. Se os consumidores
adquirem hábitos nocivos por ignorância e sucumbem a comerciais feitos por
quem só está em busca de lucro com sua saúde prejudicada, então esses consumidores
se perderam do Tao. Seus blocos foram esculpidos em formas obesas e assim eles
sofrem. Mas não há nenhuma lei objetiva de psicologia que os obriga a sofrer.
Tão logo eles começarem a agir de acordo com o Tao, seus hábitos irão melhorar
e sua ignorância irá desaparecer e eles começarão a reverter para o Bloco Não
Esculpido. Eles irão consumir porções modestas de bons alimentos, em vez de
grotescas montanhas de comida ruim.
Como eles irão tomar consciência do Tao?
Como bem sabem os jornalistas, ele não gera manchetes. Há duas maneiras para
que a consciência do Tao se espalhe: de cima para baixo ou de baixo para cima.
Qualquer delas funciona e pode dar origem a uma era de ouro. Para que o Tao se
espalhe de cima para baixo, precisamos de governantes esclarecidos; de baixo
para cima, de iniciativas de base. Foi por isso que Confúcio procurou
aconselhar os líderes militares, persuadindo-os a governar de acordo com o Tao
em vez da coerção explícita. E foi por isso que Lao Tzu escreveu o Tao Te
Ching: aconselhar cidadãos comuns (começando pelo guarda de fronteira que
implorou que ele o escrevesse), mostrando-lhes como seguir Tao, criando assim
sua própria era de ouro.
Fonte:
MARINOFF, Lou (1952 - ) O poder do Tao.
– 1ª. ed. São Paulo: Prumo, 2013.
P.230 - 232
Sua bondade é determinada por sua
vontade de ser bom e nada mais. Isto distingue o Tao de todas as religiões do
mundo. Como vimos, ‘religere’ significa “ligar” e isto é o que fazem todas as
religiões; elas ligam sua alma interior a uma divindade exterior. Por
definição, a Divindade é todo poder (onipotente), toda sabedoria (onisciente) e
toda bondade (onibenevolente). Mas como sabem os filósofos e os teólogos, isto
cria uma contradição insolúvel, conhecida no ocidente como “problema da
Teodiceia” É assim: se Deus é onipotente, onisciente e todo bondade, por que
permite a existência do mal? Por que simplesmente não erradica a maldade? Toda
religião precisa responder a esta pergunta e nenhuma pode respondê-la sem
propor uma próxima vida, uma vida depois da morte ou algum estado de coisas
futuro que irá equilibrar todo o mal com bondade, todos os atos ruins com
retidão, toda injustiça com o julgamento divino.
Embora essas explicações possam ser
bem-intencionadas e possam oferecer esperança e consolo, elas também preparam
as pessoas para sofrer e infligir sofrimento a si mesmas e aos outros, de uma
geração para a seguinte, em nome de um futuro que poderá nunca chegar.
Como as religiões não podem resolver o
problema da Teodiceia no presente, elas são obrigadas a concluir que sofrer é
necessário. O sofrimento no presente torna-se seu passaporte para o paraíso
futuro. Mas enquanto isso, você está condenado a sofrer. No final do século XX,
milhões de ocidentais desiludidos haviam rejeitado esta “solução” para seus sofrimentos.
Gradual ou rapidamente, as pessoas perderam a fé e buscaram explicações
alternativas. Até mesmo Eli Wiesel, um antigo crente devoto, que havia sido
criado para reverenciar Deus, teve sua fé quase exterminada pelo Holocausto.
Depois de ter sobrevivido a Auschwitz e a alguns dos piores males que os seres
humanos são capazes de infligir uns aos outros, hoje ele diz: “Precisamos nos
comportar como se houvesse um Deus”. Como se houvesse um Deus está muito
distante de acreditar que existe um.
Ao mesmo tempo, as filosofias ateístas
de Marx ao existencialismo entraram em moda, apesar de certamente não tornarem
as pessoas mais felizes. Os existencialistas estão entre as pessoas mais
deprimidas que conheço, enquanto os marxistas estão entre as mais descontentes
do planeta. Muitas pessoas que perdem a fé tornam-se tremendamente amargas
como aquele filósofo ateísta que conheço (e ele não está só) que disse que, se
Deus existe, então deve ser um maníaco sádico. Este tipo de ateísmo não é
exatamente uma receita para a felicidade. Além disso, se Deus existe e é um
maníaco sádico, então deve ser um deus muito infeliz.
Lao Tzu não se opunha à religião. Na
verdade, ele e Confúcio reconheciam o valor inerente das práticas rituais e
devocionais, que todas as religiões incorporam. Rituais e devoções podem ser
belos e costumam ser acompanhados por músicas comoventes. Dão significado a
nossas vidas, emprestam ritmo a ciclos sazonais, realçam a comemoração de
ocasiões especiais e enobrecem nossa existência. Mas se as instituições
religiosas se tornam corruptas, seus devotos sofrem. Foi isto que Lao Tzu
procurou evitar. Através do exercício da boa vontade, você também resiste à corrupção,
quer acredite ou não em Deus.
Por outro lado, muitos pesquisadores
sucumbiram à psicologia ocidental, que lhes oferece uma abordagem diferente e
mais nova. Você sofre hoje por causa de coisas que lhe aconteceram no passado.
Se pudermos imaginar o que aconteceu a você no passado, poderemos descobrir o
que está causando seu atual sofrimento. Caso possamos fazê-lo, poderemos
ajudá-lo a cortar os elos com sua cadeia de eventos do passado. Então, seu
sofrimento acabará e você estará curado. Essa é a teoria.
Este mito psicológico é quase tão
sedutor quanto o religioso. E é por isso que dezenas de milhões de pessoas
investiram bilhões de horas e trilhões de dólares em psicoterapia e
psicanálise, exatamente como costumavam investir (e outros ainda investem)
tempo e fortunas em orações e templos. Além disso, os ocidentais estão
consumindo quantidades sem precedentes de medicamentos e se tornando mais
infelizes a cada dia que passa. Por quê? Porque esta espécie de psicologia está
distante do Tao, uma vez que oculta sua própria versão do problema da
Teodiceia. Como ninguém deu um nome a este “bebê”, permita que eu o faça. Vou
chamá-lo de “problema da Psicodiceia”. Lembre-se de que o problema da Teodiceia
será “resolvido” em algum ponto do futuro, mas enquanto isso as pessoas estão
condenadas a sofrer. Da mesma maneira, o problema da Psicodiceia foi
“resolvido” em algum ponto do passado, mas enquanto isso as pessoas estão
condenadas a sofrer hoje.
O problema da Psicodiceia é assim: seu
sofrimento atual é causado pelo passado. Mas este passado nunca é totalmente
explicado. E é por isso que você continua a sofrer, mesmo que já tenha feito
semanas, meses ou anos de psicoterapia. Você irá precisar de muito mais
semanas, meses e anos para explicar melhor o passado. Então, seu sofrimento
supostamente estará curado. Mas espere um instante: agora existe outro
problema. Enquanto está gastando todas essas semanas, meses e anos com
psicoterapia, você estará acumulando mais e mais do passado! Coisas novas
continuam acontecendo e imediatamente se tornam coisas do passado, que por
definição podem fazê-lo sofrer. Assim, elas também devem ser explicadas. E
assim sua psicoterapia nunca termina, nem seu sofrimento.
Acha que estou brincando? Então pense
duas vezes. Você conhece a primeira lei de Newton? “Um objeto em repouso irá
permanecer em repouso até que sofra a ação de uma força desequilibrada.” Isto
vem diretamente do Tao. A mente taoísta é como um objeto em repouso. Pelo fato
de estar em repouso, ela pode realizar tudo. Lembre-se do princípio do
vou-voei: ação através de inércia. Além disso, a mente do taoísta permanece em
repouso, porque ele não permite que ela seja afetada por forças
desequilibradas. Supostamente a psicoterapia ajuda a equilibrar mentes
desequilibradas, mas devido ao problema da Psicodiceia, ela pode se tornar mais
uma força desequilibrada. A psicoterapia pode agitar as emoções em vez de
acalmar a mente.
Você conhece a primeira lei da
psicoterapia? Eu a aprendi com Irvin Yalom, um dos maiores psicoterapeutas do
mundo. Estávamos tomando café e conversando em San Francisco quando ele disse:
“Sempre há mais alguma coisa”. É por isso que a psicoterapia nunca termina.
Sempre há mais alguma coisa, alguma força desequilibrada ainda não explicada,
pra impedir sua mente de permanecer em repouso.
O problema da Psicodiceia é exposto por
Laurence Sterne em seu livro Tristram Shandy. Pobre Tristram, o protagonista
bem-intencionado, está tentando conscientemente escrever sua autobiografia. O
problema é que ele demora um ano para registrar fielmente os eventos de apenas
um dia. Assim ele nunca poderá terminar, mesmo que viva para sempre. O mesmo
vale para a psicoterapia: nunca pode terminar. Quanto mais você vive, maior é o
seu passado. Quanto maior seu passado, mais longa a explicação necessária para
definir por que você está sofrendo hoje. A religião pode fazer as pessoas
sofrerem declarando que a cura para o sofrimento está no futuro. A psicologia
também pode fazer as pessoas sofrerem declarando que a cura para o sofrimento
está no passado. Até mesmo o budismo pode causar sofrimento declarando que ele
é um passo necessário no sentido da ausência de sofrimento. Mas o Tao alivia o
sofrimento diretamente, declarando que ele não é necessário. Se você sofre,
diz Lao Tzu, é porque está infligindo a você mesmo maldade, incorreção ou
injustiça. Uma vez que reconheça essas coisas, o que pode ser mais fácil de
falar do que de fazer, você poderá optar por imergir em bondade, correção e
justiça. Então, seu sofrimento irá passar imediatamente. E se você fizer outros
sofrerem, estará prejudicando a eles e, portanto, a si mesmo, causando ainda
mais sofrimento desnecessário.
A maneira mais rápida de terminar com
seu sofrimento é exercer a bondade com os outros, praticar correção com eles e
tratá-los com justiça. Então, o sofrimento deles irá diminuir e o seu será
aliviado imediatamente, graças ao poder do Tao.
MARINOFF, Lou (1952 - ). O poder do Tao.
– 1ª. ed. São Paulo: Prumo, 2013.
p.132 - 135
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