O VALIOSO TEMPO DOS MADUROS - Mário de Andrade
O Valioso Tempo dos
Maduros
" Contei meus
anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já
vivi até agora.
Tenho muito mais
passado do que futuro.
Sinto-me como
aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou
displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo
para lidar com mediocridades.
Não quero estar em
reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com
invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos
e sorte.
Já não tenho tempo
para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas
alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para
administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são
imaturos.
Meu tempo tornou-se
escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa.
Sem muitas cerejas
na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana: que sabe rir de
seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da
hora, não foge de sua mortalidade, quero caminhar perto de coisas e pessoas de
verdade.
O essencial faz a
vida valer a pena.
E para mim, basta o
essencial!"
Mário de Andrade
(1893 – 1945) Poeta e ativista cultural
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